quinta-feira, 29 de outubro de 2009

AS REGRAS TEM QUE SER CLARAS

exame/gestão


Sua empresa jamais atingirá suas metas se tudo o que tiver para orientá-la for uma lista de lugares-comuns pendurada na parede

Por Jack Welch 15.10.2009 00h01

A missão de uma empresa determina exatamente a direção em que todos devem seguir. A missão determina para onde uma empresa vai, qual a sua essência. Mas ela não explica como os funcionários devem chegar lá.

A descrição dessa "personalidade corporativa" está -- ou deveria estar -- na declaração dos valores da companhia. E são precisamente esses valores que deveriam orientar a conduta de seus funcionários.

Infelizmente, a maioria dos executivos costuma dar pouca importância a isso. Cultivar valores que sirvam de suporte à missão é algo que exige o envolvimento de toda a empresa e o comprometimento direto da equipe executiva. Os quatro princípios apresentados a seguir podem ajudar a levar adiante esse processo.

1. A criação de valores precisa ser um processo interativo entre todos os funcionáriosA equipe executiva poderá elaborar uma primeira versão, porém esse documento deverá ser revisto continuamente por todos da empresa. É preciso que os executivos criem um meio pelo qual as pessoas se sintam obrigadas a contribuir. Embora tal esforço possa gerar certa confusão, o fato é que, quanto mais pessoas participarem, mais ideias virão à tona. E, principalmente, a adesão será maior.

2. A descrição deve ser específicaLogo que assumi o comando da GE dei muita ênfase a valores vagos. Em 1981, escrevi no relatório anual da companhia que o líder deveria "transpirar excelência" e agir como se fosse "dono da empresa". Todos são lugares-comuns que podem até soar bem, mas de fato não correspondem a comportamentos de verdade.

Uma década mais tarde, em 1991, já havíamos feito progressos consideráveis. Mais de 5 000 funcionários haviam sido recrutados para ajudar a definir nossos valores. Desse exaustivo debate surgiram alguns imperativos, como "Seja intolerante com a burocracia" e "Encare a mudança como oportunidade de crescimento".

Contudo, talvez devêssemos ter levado a discussão sobre valores e comportamentos ainda mais longe. Em 2004, vi Jamie Dimon e Bill Harrison, na época, respectivamente, presidente do Bank One e presidente e CEO do JPMorgan Chase (hoje, Dimon é CEO e presidente do conselho; Harrison se aposentou), trabalharem em valores e comportamentos para a nova empresa criada com a fusão do Bank One e do JPMorgan Chase.

O documento em que começaram a trabalhar veio do Bank One e listava valores e comportamentos correspondentes num nível de detalhes que eu jamais havia visto. Por exemplo: "Tratamos os clientes da forma como gostamos de ser tratados". Isso é algo bem tangível, mas o Bank One identificava dez ou 12 atitudes que davam vida a esse valor. Entre elas, "Não permita jamais que os conflitos do centro de lucros o impeçam de fazer o que é melhor para o cliente" e "Ofereça ao cliente um acordo bom e justo. Criar um bom relacionamento leva tempo. Não tente aumentar o lucro de curto prazo à custa de uma relação que precisa de tempo para se firmar".

3. Para que os valores tenham realmente algum significado, as empresas devem abertamente premiar os empregados que os cultivam e "punir" os refratáriosAcredite, isso fará com que a empresa vença mais facilmente. Na GE, todas as vezes em que pedíamos a um de nossos executivos com desempenho nota 10 que deixasse a empresa porque não apresentava os valores requeridos -- o fato era tornado público. E a empresa respondia incrivelmente bem. Como se tratava de uma companhia que vivenciava cada vez mais seus valores, as pessoas se sentiam cada vez mais comprometidas em vivenciá-los também. À medida que a satisfação de nossos empregados aumentava, isso se refletia nos resultados financeiros.

4. Para que a missão e os valores da empresa trabalhem juntos de maneira eficiente é preciso que um reforce o outroEmbora pareça óbvio, é incrível o número de vezes que isso não acontece. É mais frequente que a missão e os valores da empresa entrem em colapso devido às pequenas crises do dia a dia. Se, por exemplo, um concorrente baixa o preço, você também baixa -- e com isso compromete seu empenho em atender o cliente da melhor maneira possível. É o tipo de coisa que parece pouco importante, mas, se não for sanada, pode facilmente prejudicar a empresa ou até mesmo arruiná-la. Na minha opinião foi o que aconteceu, por exemplo, com a falida Enron.

A Enron era no início uma companhia de energia e de gasodutos cujo objetivo era retirar gás do ponto A e transportá-lo até o ponto B de forma barata e rápida, missão que cumpria bem graças ao conhecimento que tinha na obtenção e distribuição de energia. Depois, a empresa mudou de missão e passou a atuar no segmento comercial de olho num crescimento mais rápido. Gasodutos e a geração de energia passaram para segundo plano.

A mudança deve ter sido empolgante na época, mas ninguém parou para pensar nos valores e comportamentos que serviriam de base para essa mudança de objetivos um tanto precipitada. Infelizmente, não havia procedimentos que servissem de contrapeso aos prósperos MBAs que haviam ingressado na empresa. E foi nesse contexto -- ou melhor, nessa ausência de contexto -- que ocorreu o colapso da Enron. Milhares de inocentes perderam o emprego por causa da inexistência de interação entre missão e valores.

Sua empresa jamais atingirá seu potencial máximo se tudo o que tiver para orientá-la for uma lista de lugares-comuns pendurada na parede da recepção. Quando você estiver trabalhando em sua declaração de valores, terá de comparecer a reuniões longas e polêmicas. Quando isso acontecer, você vai achar que poderia se contentar com valores vagos e genéricos. Mas não se engane: valores assim não vão levá-lo muito longe.